O dia em que Rosa morreu
Atílio Alencar
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No dia em que Rosa morreu, a cidade se vestiu de quietude. A avenida vazia, o asfalto novo, as paineiras recém-floridas, a estação indecisa entre o calor minguante e o vento frio. Tudo que um dia viu Rosa passar, todos os acenos congelados nas janelas, as conversas interrompidas - tudo que viu Rosa passar agora resta insuficiente, incompleto, esboçado como as palavras do freguês habitual que chegava para o vinho, do vinho bebia, e, depois, partia com a quentura da prosa no coração.
No dia em que Rosa morreu, nem os cuscos latiram. Ficou só a ausência de som, de sentido, um buraco escavado no esquerdo do peito. Se os sinos dobraram, ninguém ouviu. Serena, a cidade engoliu o choro, de costas para o vento do Vêneto, o vento que tantas vezes resfriou as costas de Rosa atrás do balcão do bar. O vento do Vêneto, como uma voz ancestral, a voz que precede a chegada dos primeiros, era também a voz de Rosa e dos seus, na insistência de atravessar sempre outra vez o oceano da memória.
As árvores da praça envoltas na neblina despiram-se das folhas, ao golpe suave do vento de abril, soprando mensagens que só Rosa podia entender. Era um chamado, um adeus. Da mesma porta em que viu as gerações chegando e partindo da cidade pacata, com o tempo imóvel como moldura, Rosa investigou a alma em cada olhar, a intenção em cada gole, o agudo insinuante da torre da igreja como um monumento à saudade eterna.
Os olhos de Rosa eram os olhos da cidade a beber os últimos raios do sol. Da coxilha amiga, a de sempre, a mesma terna saudação.
FOMOS TODOS SEUS FILHOS
Sofreu as dores e as fugas, mas teve forças, porque viu a vida e a morte no nascedouro das coisas. Rosa dos ventos, dos partos, dos dialetos sem compromisso com a língua mãe. Rosa menina que descobriu a dor no primeiro choro da criança, atenta ao trabalho da mãe, perplexa com o trauma do surgimento. Ninguém nunca esquece a primeira visão da vida. Rosa a teve duas vezes, mais, quem sabe muito mais, porque da sua calma iam brotando pessoas novas, endereços novos, amores enviesados nas janelas semiabertas para o outono.
Quando perguntavam à Rosa, afinal, de onde vem a calma, a esses, Rosa respondia com o múltiplo profundo do pensamento, com um ensaio de sorriso a forjar enigmas, com a prudência das matriarcas no labor da concepção.
No dia em que Rosa morreu, fomos todos seus filhos, seus netos, seus amores. Quisera fôssemos um dos seus personagens, alguém a quem se conta um segredo inviolável, a própria chave que abre a porta de uma vida para outra.
Nesse dia triste em que Rosa morreu, o abril se despedaçando qual nervuras de folha seca, a chuva caiu oblíqua sobre os limoeiros, deixando o dia carente de sentido. Vida que se esvai entre os galhos, buscando a fonte da terra.
De saudade, o dia fechou a cara e olhou para o chão. Rosa voava. Cabisbaixos, saudosos, perdemos o espetáculo do seu voo. Para o resto da vida, elegeremos a nuvem mais bonita no céu como uma lembrança de Rosa.
Em memória de Dona Rosa Dotto, com carinho.
Então é Natal
Fabiano Dallmeyer
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Com exceção de países ortodoxos onde o Natal é comemorado no dia 7 de janeiro, o mundo comemora a data no dia 25 de dezembro. Com sua origem nas celebrações do nascimento anual do Deus Sol no solstício de inverno - natalis invicti Solis - a igreja católica no século 3 deu um novo significado para a festividade, com intenção de estimular a conversão de pagãos, passou a comemorar o nascimento de Jesus de Nazaré.
NOVOS TEMPOS
Grande parte da Europa teme uma terceira onda da pandemia do coronavírus devido à chegada do Natal e das festas de Ano Novo. Estas datas serão decisivas para um aumento do número de novos casos em janeiro e fevereiro. Muitos países europeus estão fechando o comércio e antecipando as férias escolares. A Alemanha, que já tinha decretado seis semanas de restrições, tomou a decisão de apertar ainda mais as medidas restritivas. Mesmo os países com um menor número de casos estão temendo que as festas de final de ano se tornem o gatilho para um aumento de casos da Covid-19.
No Reino Unido, por exemplo, que atingiu o pico de casos na segunda onda no meio de novembro e apresentava até ao início de dezembro um declínio da curva de novos casos, os valores voltaram novamente a subir nos últimos dias. Angela Merkel, chanceler da Alemanha, anunciou este fim de semana, novas medidas mais restritivas que irá manter até ao dia 10 de janeiro. A vida pública será quase completamente encerrada. Os bares e restaurantes vão fechar durante seis semanas, só ficam abertos os que disponibilizarem serviço de entrega. As lojas vão também estar encerradas. As férias de Natal nas escolas também começaram mais cedo.
Já na Holanda decretaram o encerramento de todos os estabelecimentos não essenciais até dia 19 de janeiro, devido ao aumento das novas infecções. As escolas vão encerrar e as profissões que obrigam o contato devem também ser suspensas. O recolher obrigatório não será imposto, mas os cidadãos já foram convidados a sair o menos possível. Igrejas e outros tipos de locais religiosos vão permanecer abertos, e as competições esportivas vão ocorrer sem público.
A Itália prepara também a chegada do Natal com toque de recolher obrigatório. O país viu a curva de novos casos cair nas últimas semanas, mas muitos italianos saíram à rua nos últimos dias para fazer compras, o que deixou o governo e as autoridades apreensivos. Na pauta está um novo confinamento obrigatório de 24 de dezembro até 2 de janeiro, com fechamento de lojas, bares e restaurantes e o recolher obrigatório.
Em Portugal, anunciaram um alívio nas medidas, sendo a circulação entre municípios totalmente permitida no Natal e restrita no Ano Novo.
O certo é que, com as novas restrições, muitas famílias estarão "unidas" através da tela de um computador, ou de um telefone. Assim, finalmente a piada do "é pavê ou é pá comê", faz sentido. Feliz Natal e um Ano Novo próspero e diferente!